... de pensar que quando eles são pequeninos, é tudo tão mais fácil. Saudades disto, saudades daquilo, agora só pode piorar. E de alguma forma, as bochechas gordas e o cheiro a natas de manhã deixam muitas saudades. As gengivas desdentadas, os pés suadinhos com chulé de bebé, o caberem por inteiro no nosso colo, o cotão nos dedos dos pés, o sermos o objecto incondicional da adoração deles.
É verdade que me dá um aperto cada vez que vejo uma foto delas pequeninas ou um filme onde ouço a voz pequenina da qual já nem me lembrava. É verdade que o tempo voa e que já não volta atrás, mas por isso mesmo há que desfrutar de todas as fases sem tanto saudosismo. E contra mim falo.
Que o antes é que era. Não era nada. Antes eram mais chatas, não tomavam banho sozinhas, tinha que lhes dar comida à boca enquanto elas a cerravam com um tranco anti-roubo, faziam algumas birras de envergonhar até ao couro cabeludo, choravam todos os dias para ficar na escola, eram menos obedientes, dormiam pior, davam muito mais trabalho. Eu sei que a adolescência vai ser um período exigente, mas neste momento adoro a idade delas.
A Joana está numa fase companheira e muito muito fácil. É uma miúda um bocadinho temperamental, ui se estiver para aí virada, é uma verdadeira drama queen, injustiçada pelo mundo enquanto diz uns disparates em voz esganiçada que é coisa que me põe doida e depois de repente já somos duas a falar em falsete e parece uma casa de gente doida. Somos muito parecidas.
De manhã não lhe toquem, não lhe falem, deixem-na acordar devagarinho sem grandes alaridos ou demonstrações de carinho. Igual. Mas é a minha companheira de conversas, de planos, de aventuras na piscina, adora ajudar, participar e é super responsável com as coisas da escola. É uma miúda com muita confiança nas suas capacidades e foi eleita delegada de turma logo na 1ª eleição da turma, o que a deixou muito feliz pela confiança que os colegas depositaram nela. Adora jogar monopólio antigo (ainda em escudos e a cheirar a mofo), (re)ensinar-me as divisões com uma data de números dos dois lados, ajudar-me a dividir o miolo das agendas e pôr os convites dentro dos envelopes. É muito interessada, gosta imenso de aprender e é muito ligada à família, adora estar com os avós, tios e priminhos do seu coração de quem toma conta com sentido de prima mais velha. Mas se de repente fica farta, acabou-se. Dá tudo o que tem a dar, mas se se esgota, precisa do seu espaço.
Adora programas só a quatro e desfruta das nossas viagens como uma pequena adulta. Tem um sentido de humor engraçadíssimo e ri-se das minhas maluquices e de todas as piadolas parvas. Está tão mais fácil agora do que quando era pequena. É uma filha muito querida e dedicada, farto-me de lhe dizer isso porque lhe dou muito valor.
A Rita é um raio de sol, tem um sorriso na cara por defeito. É muito fácil de levar, apesar de ser mais teimosa e menos permeável a argumentação. É raro fazer uma birra e está quase sempre bem disposta. É só tocar-lhe de manhã e a boca desenha logo um sorriso desdentado e dispara logo com um b'dia. É mais melosa e meiguinha mas ao mesmo tempo mais desligada das outras pessoas e emocionalmente mais independente. Está a crescer, mas ainda se enrosca no meu colo e ainda tem laivos de bochechinhas e barriga saída. Ainda é o meu baby sem as chatices dos bebés.
Não interioriza regras com tanta facilidade e deixa um rasto de desarrumação e de lixo por onde passa. Sofre com a mesma intensidade quer a deite às 21h30 ou às 2 da manhã. Nunca obedece à primeira e quando é para fazer qualquer coisa que exija que mexa um dedinho, faz peso morto e espalha-se tipo lagarta no chão e fica para ali a contorcer-se devagar e a lamuriar-se da vida. É uma agarrada às coisas e nem papelinhos rasgados que encontro nos bolsos ou na mochila, me deixa deitar fora. Tenho que andar sempre às escondidas a pôr ordem na lixeira. Já partilha tudo com os primos, coisa que no início era bem difícil, mas dar qualquer coisa dela é quase impossível. Todos os dias quer fazer trabalhos manuais comigo, adora ensinar-me o que aprendeu na expressão plástica mas de vez em quando (ainda que raramente) tenha achaques cada vez que a coisa não corre bem. Rasga os trabalhos ou desenhos que não estão a ficar como quer, tem este lado perfeccionista e entra ali numa espiral de irracionalidade que só ficando sozinha a rasgar coisas é que a coisa acalma. Mas é uma menina super equilibrada e uma filha muito meiguinha, alegre e divertida.
Estamos numa fase muito boa, até porque tirando o caminho escola-casa em que quase se matam no carro, dão-se muito melhor agora do que antes. E portanto que mais posso pedir? Bebés que choram para dormir e fazem birra para comer? Tenho sobrinhos pequeninos para matar saudades. A elas mando recadinhos nas lancheiras e recebo bilhetinhos debaixo da almofada. Que mais posso querer?